quinta-feira, 5 de abril de 2018

CONTRASTE

Estou entre o preto e o branco
Transitando gradualmente
Pela escala infindável dos tons de cinza.
E isso é ser tão decisivo quanto um céu nublado.
Pronto: sou nublado. Opaco.
A luz intensa me cega
Assim como a total escuridão.
Estou num momento fugídio
Capturado entre o clique do interruptor
E a lâmpada que acende.
Entardeci, e assim fiquei, sem esperar
Camuflado pelo lusco-fusco.
Sou um lago recôndito
Cheio de lágrimas indistintas.
Tristeza e alegria vêm mergulhar em mim
Atirando-se em magníficos saltos ornamentais
Sem saberem nadar.
Sou a brisa tépida vagando na madrugada.
Invado quartos, pelas janelas entreabertas, enquanto todos dormem.
Aliso suas faces, balanço a cortina
Afago o fogo da vela, sem afetação.
Não morro, não mato. Não inspiro, não refresco.
Trago o ar estagnado dos casebres abandonados -
O ar que falta aos últimos suspiros.
Depois vou embora, sem nada cerrar, ou escancarar
Deixando pelo quarto um leve olor de hálito do pântano.
Estou entre a insanidade e a lucidez.
Não durmo, nem acordo.
Permaneço em estado de sonolência
No meio de um confronto
Onde os opostos se chocam.
Estou sendo linchado agora, por acidente.
Mas a dor gerada pela surra constante me põe em estado anestésico.
Nem fantasia, nem realidade
Nem presença, nem ausência
É outro plano, mal sintonizado, de leve oscilação
Onde os mortos revivem e a infância se perde.
Tudo e nada. Nada e tudo.
Gêmeos siameses, filhos de mães diferentes
Andam ligados, lado a lado, em perfeita coordenação.
Tenho ganas de assassinar, dividir a carne e a dor.
Tenho vontade de abraçar todo o mundo, muito calorosamente...
Ou tudo. Ou nada.
Mas a faca embotou-se ao relento.
Mas os braços são curtos demais.
Ou tudo, ou nada. Repara:
Sou um mosquito perfeito e asqueroso
Pousado sobre o ídolo sagrado.
Desconheço o que seja céu e inferno
E assim me torno sublime e eterno.